Moraes suspende atos sobre IOF e convoca audiência de conciliação entre governo e Congresso
BRASÍLIA - O ministro Alexandre de Moraes , do Supremo Tribunal Federal (STF) , suspendeu nesta sexta-feira, 4, os efeitos de todos os decretos que tratam sobre o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e determinou uma audiência de conciliação entre o governo Lula e o Congresso sobre o tema no dia 15 de julho.
Segundo o ministro, o embate entre o Executivo e o Legislativo, com “sucessivas e reiteradas declarações antagônicas” é “indesejável” e contraria “fortemente” o princípio constitucional que “determina a independência dos Poderes e exige a harmonia entre eles”.
O encontro de conciliação foi marcado para as 15h do dia 15 de julho. Moraes determinou a intimação, para participação na audiência, das Presidências da República, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, assim como da Procuradoria-Geral da República, a Advocacia-Geral da União e das demais partes da ação.
“Após a realização da audiência de conciliação, será analisada a necessidade de manutenção da liminar concedida (a suspensão tanto dos decretos do Executivo como do Legislativo) ”, indicou.
O ministro ressaltou que a decisão em questão foi motivada por provocações tanto do Executivo como do “maior partido de oposição” (o PL) e de partido da base governista (PSOL). Na visão de Moraes, o despacho demonstra a “importância da efetiva jurisdição constitucional exercida pelo STF, para afirmar a validade absoluta da Constituição Federal”.
“As ações demonstram a importância de não se confundir o exercício da legítima competência constitucional do STF com um suposto e indefinido ativismo judicial e afastam a confusão entre discursos vazios de autocontenção do Poder Judiciário com sugestões para uma trágica omissão ou a grave prevaricação ou mesmo com uma inaceitável covardia institucional para que não se decida e não se faça prevalecer o texto constitucional”, registrou Moraes.
Segundo o ministro, a princípio, tanto os decretos presidenciais sobre o imposto quanto o decreto editado pelo Congresso para derrubar a medida “aparentam se distanciar dos pressupostos constitucionais” exigidos para as respectivas normas.
Na medida do Executivo, o ministro aponta, a princípio, “séria e fundada dúvida sobre eventual desvio de finalidade para sua edição”. No decreto legislativo, Moraes questiona o fato de ele incidir em decreto autônomo do presidente da República.
Avaliando as alegações do governo Lula, o ministro do STF indicou que a Constituição não admite que um decreto legislativo seja operado contra medidas que não regulamentem leis. De acordo com Moraes, os atos do Executivo não se submetem a controle repressivo por meio de decreto legislativo.
Nessa linha, Moraes destacou que a possibilidade do Congresso sustar um decreto do Executivo é algo “excepcional” e que se restringe a atos que “excedem o poder regulamentar”.
De outro lado, o ministro considerou razoável a alegação de que o IOF é um tributo extrafiscal, sem finalidade arrecadatória e ponderou que o Judiciário pode analisar possíveis desvios de finalidade de atos administrativos do Executivo.
“Essa dúvida na finalidade da edição do decreto, apontada por ambas as Casas do Congresso Nacional na edição do decreto legislativo, é razoável quando o Ministério da Fazenda divulgou um potencial acréscimo de dezenas de bilhões às contas públicas: R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026 e, ainda, em pronunciamentos à mídia, defendeu a alta do IOF como medida eminentemente arrecadatória, necessária para atingir a meta fiscal”, observou o ministro.
Moraes ressaltou que, pelo caso envolver um decreto autônomo do presidente da República, caso os partidos considerassem a medida inconstitucional, deveriam ter entrado com uma ação no STF, como fez o PL, sem a aplicação pelo Congresso Nacional de um “mecanismo previsto para o controle de eventuais excessos do Executivo no exercício do poder regulamentar”.
Impacto financeiro
O ministro afirmou que o impacto financeiro divulgado pela equipe econômica do governo com o aumento do imposto levanta “séria dúvida sobre a natureza” da medida. Ele alertou que, se for demonstrado que a elevação das alíquotas se deu com fins puramente arrecadatórios, está caracterizado desvio de finalidade e, consequentemente, a medida seria inconstitucional.
“O impacto financeiro relatado por uma das requerentes aponta a existência de séria dúvida sobre a natureza difusa da medida, a atingir diversos setores econômicos indiscriminadamente, sem atenção para qualquer mensuramento relativo aos fins exigidos pela extrafiscalidade”, observou na decisão.
Caso os decretos que aumentaram o IOF estejam comprometidos por desvio de finalidade, assinalou o ministro, acabariam por “atentar contra o princípio da proporcionalidade e a anterioridade tributária”.
“O Poder Judiciário, portanto, deverá exercer o juízo de verificação de exatidão do exercício da discricionariedade administrativa perante os princípios da administração pública, verificando a realidade dos fatos e também a coerência lógica do ato administrativo com os fatos”, afirmou.
Judicialização do IOF
Na terça-feira, 1º, o governo Lula acionou o STF para tentar manter em vigor os decretos que aumentaram o IOF. A decisão foi do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após avaliação da Advocacia-Geral da União (AGU).
Os decretos foram derrubados pelo Congresso na semana passada, em uma derrota do governo Lula, que contava com o aumento no IOF para cobrir o rombo nas contas públicas.
Jorge Messias, ministro da Advocacia-Geral da União, afirmou que o Congresso Nacional não poderia ter sustado “de modo algum” o decreto presidencial que altera regras de cobrança do IOF. “Considerando que a Ação Declaratória de Constitucionalidade visa exatamente preservar a integridade, a higidez do ato praticado pelo chefe do Poder Executivo, a conclusão lógica é que este decreto continuaria válido. Portanto, ele não poderia ter sido, de modo algum, suspenso por ato do Congresso Nacional”, disse.
Na quarta-feira, 2, Lula defendeu a decisão do governo de recorrer ao STF. Segundo ele, o erro não é do governo ao levar o caso à Justiça, mas do descumprimento do acordo fechado entre o governo e a cúpula do Congresso na casa do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), no mês passado.
“Se eu não entrar com recurso no Judiciário, eu não governo mais o País”, afirmou o presidente, que classificou a decisão de Motta de pautar a votação do tema sem acordo prévio como “absurda”. “Se eu não for à Suprema Corte, eu não governo mais o País. Esse é o problema. Cada macaco no seu galho. Ele legisla, e eu governo”, repetiu.
Entidades empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Confederação Nacional do Transporte (CNT) e a Confederação Nacional do Comércio (CNC) pediram ao Supremo para manter a decisão do Congresso. O pedido foi protocolado na mesma ação apresentada pelo governo Lula.






